Nos últimos anos, as empresas prestadoras de serviço de telemarketing, cobrança e call-center em geral estão sendo cada vez mais pressionadas por leis impostas pelos governos e iniciativas de autorregulamentação criadas pelos contratantes. Como será o futuro dessa prática? Quais são as alternativas que devem surgir?
Para entendermos onde isso tudo pode chegar, é importante compreender a evolução do discador, principalmente a discagem preditiva, no Brasil e no mundo, bem como qual é a forma adotada pelos países da Europa e América do Norte para regulamentação tais atividades.
História da discagem preditiva
A discagem preditiva surgiu da necessidade natural de ocupar melhor a mão de obra contratada para as operações conhecidas como Outbound, ou seja, operações onde uma empresa precisa contatar clientes em altos volumes diariamente.
Além das operações de vendas, conhecidas como “televendas”,
existem muitas outras necessidades não tão conhecidas de contato com clientes,
seja no formato B2C (empresas com pessoas físicas) como B2B (empresas com
empresas).
Além do telemarketing (televendas), cobrança (telecobrança), temos as modalidades de agendamentos (visitas, consultas, atendimento de guichê), o telesales (que é a substituição de equipes de campo por vendedores sentados em suas posições de atendimento.
As empresas têm a necessidade de telefonar maciçamente para
uma base de contatos por vários motivos e necessidades diferentes. As primeiras operações eram constituídas de
uma listagem e um telefone em cima de uma mesa, como podemos ver no filme “O
Lobo de Wall Street”. Com o tempo, as operações foram se automatizando.
Da discagem manual, diretamente do “disco” (de onde surgiu o
termo discar), as operações evoluíram para a discagem por teclas (telefone
digital) e depois para a discagem computadorizada (discador preview), que, ao clicar em um nome,
a discagem é realizada imediatamente.
Logo em seguida surgiu o discador power, que é similar ao preview com o diferencial
de ter início automático, não necessitando da intervenção do agente.
Baixa Ocupação de Agentes
Todos os modelos citados anteriormente enfrentam o mesmo
problema, que é o fato do operador ficar ocioso e aguardando o processo de
discagem. Nesse processo, ele escuta:
• Discagem (os sons que chamamos de DTMF)
• Toque (tom de ring ou ringback)
O operador também pode ouvir a caixa postal do celular ou
telefone fixo, secretária eletrônica, som de ocupado, mensagem de telefone
inexistente, dentre outras possibilidades.
Com isso, percebeu-se que, dentro do turno de 6 horas
regulamentado no Brasil, a maior parte do tempo do agente era perdido discando
ou ocioso esperando uma chamada.
Se você calcular que algumas dessas operações podem
facilmente ter mais de 1000 pessoas envolvidas, percebemos o desperdício de
produtividade nesses modelos antigos de discagem.
Abaixo veja um exemplo de cálculo de 1000 pessoas com baixa
ocupação para entender o desperdício que isso pode gerar:
• Salário Mensal: 900,00
• Encargos: 70%
• Horas Mensais: 144
• Ocupação: 50%
• 1000 x (R$ 900,00 + R$ 630,00) * 0,5 = R$ 765.000,00
Isso comprova que a baixa ocupação dos agentes, para
operações médias ou grandes tem um custo de ineficiência muito grande.
Com essa pressão para reduzir custos, o discador preditivo foi ganhando espaço nas operações, prometendo elevar as ocupações para patamares acima de 80%, e até mais em alguns casos.
Então, como a discagem preditiva consegue atingir esses patamares de ocupação? É claro que para isso ele tem alguns diferenciais. Como vimos, as principais fontes de ineficiência são:
1) O agente é obrigado a ouvir a chamada sendo discada
2) O agente é obrigado a ouvir o ringback.
3) A chamada pode acabar em caixa postal, ocupada,
não-existente.
Além dos problemas acima, ainda temos a possibilidade de
discar e não encontrar a pessoa certa, que pode ser resolvido com os robôs do CPC.
Vantagens da discagem preditiva
Diferente dos modelos acima, a discagem preditiva consegue elevar a ocupação e, portanto, melhorar a eficiência financeira das operações.
Isso reflete em menor custo para os clientes dessas
empresas, porque, com a grande concorrência do setor, as empresas com maior
produtividade, que conseguem automatizar suas áreas, acabam sendo obrigadas a
repassar parte desses ganhos aos clientes, trocando por Market share.
Como o Discador Preditivo Soluciona
os Problemas?
Problema 1 e 2: O
agente é obrigado a ouvir a discagem e o ringback
Solução: Para
resolver esse problema, o discador faz o processo de discagem com base em
cálculos, e não envolve nenhum agente humano nesse momento. Com o tempo ele
aprende que a cada 10 discagens, ele consegue apenas 3 “alôs”, então ele se
programa e auto-corrige o tempo todo para entregar chamadas apenas com o “alô”
para os agentes do call-center.
Problema 3:
Chamadas ocupadas, número não existe, etc
Solução: O
discador conta com algoritmos de detecção para secretária eletrônica, mensagem
de operadora, dentre outras sinalizações que não interessam entregar ao agente.
As palavras-chave aqui são AMD (Answer Machine Detection) e CPA (Call Progress
Analysis).
Como é possível observar, os melhores discadores preditivos
entregam chamadas melhores, com pessoas reais do outro lado, prontas para
conversar, melhorando consideravelmente a produtividade do call-center.
Para realizar todos esses processos com tanta eficiência, o
discador precisa, muitas vezes, discar mais chamadas do que precisa. Se algum
cálculo sair um pouco errado, por exemplo, se por algum azar todas as chamadas
daquele momento durarem um pouco mais, ele será obrigado a descartar algumas
chamadas.
O mercado chama tal processo de “drop”. Quanto maior o drop
permitido na operação (pois é um parâmetro configurável), maior será a
ocupação, mas também a quantidade de clientes que atenderá chamadas que serão
desligadas rapidamente sem ter uma continuidade (dropadas).
Então com isso temos uma boa visão do que a discagem preditiva faz para os call-center e telemarketings, e também vemos porque o uso indiscriminado da ferramenta está provocando iniciativas de autorregulamentação e de regulamentação governamental.
Regulamentação nos Estados Unidos
Talvez uma forma de entender o futuro dessa ferramenta seja entender as regulamentações estrangeiras.
Nos Estados Unidos, as regras de televendas são regulamentadas pelo FTC (Federal Trade Comission). As regras do FTC são as seguintes, por campanha:
• Máximo de 3% de drop (abandono)
• Telefone tocar por pelo menos 15 segundos ou 4 rings
• No caso de alô, e não conseguir agentes em 2 segundos,
colocar uma gravação com o nome da empresa que está ligando e um telefone de contato.
• Manter documentação auditável dos números acima.
• A cada 30 dias os números são resetados.
A Comissão Federal de Comércio (FTC) e a Comissão Federal de
Comunicações (FCC) estão desenvolvendo ações para tentar barrar as chamadas de
robôs. O volume de ligações indesejadas, incluindo as feitas por robôs de
telemarketing, tem mudado. Foram registradas, pelo FCC, 232 mil em 2018 e 185
mil em 2017.
Os EUA criaram um cadastro em que os consumidores que não
querem receber chamadas de telemarketing podem registrar seus números de
contato. Entretanto, nos EUA os robôs evoluídos aprenderam a burlar o cadastro.
Segundo dados do FTC, mais de 5 milhões de reclamações foram
feitas em 2018 de americanos que se registraram nesse sistema “Do Not Call” e
mesmo assim continuaram recebendo ligações de empresas.
Regulamentação na Austrália
A Austrália possui um conjunto de regulamentos nacionais de
publicidade conhecidos como Lei do Consumidor da Austrália (ACL), que seguem a
precedência estabelecida por legislação semelhante em outros países.
A ACL abrange tópicos como propaganda enganosa, propriedade
intelectual e regulamentação de preços – um entendimento completo dessas leis é
essencial para os novos negócios australianos e para os profissionais de
marketing internacionais.
A Austrália também possui suas próprias leis de marketing
relacionadas a chamadas de telemarketing e spam, estabelecidas pela Lei de Spam
do país em 2003.
Ao fazer uma chamada de marketing, a gravação ou o agente
que faz a ligação deve fornecer informações específicas assim que a ligação é
iniciada, como:
- O nome da pessoa que fez a chamada
- O nome da empresa ou organização que ela representa
- O objetivo da chamada
Se solicitado, você também deve estar preparado para
fornecer ao destinatário as seguintes informações:
As informações de contato da empresa ou organização que está
fazendo a ligação.
O nome e as informações de contato da pessoa em sua
organização responsável por lidar com consultas e reclamações.
Além disso, você só pode fazer chamadas de telemarketing
durante períodos específicos, ou seja, em dias úteis das 9:00 às 20:00 e aos
sábados, das 9:00 às 17:00.
Regulamentação na Inglaterra
No Reino Unido era comum nos anos 90 receber ligações
não-solicitadas dez vezes ao dia, assim como acontece no Brasil.
Porém, as agências reguladoras de marketing do Reino Unido
começaram a adequar os discadores preditivos a seus códigos de conduta. Sem o
monitoramento frequente e penalidades, não houve uma mudança expressiva quanto
a isso.
Nos anos 2000 as regras passaram a ser extremamente rígidas
para discadores preditivos e têm produtividade limitada. As associações
empresariais do país solicitaram que as atividades de outbound passassem a ser
opt-out ao invés de opt-in.
Os consumidores também pediram para dar opt-out em escala
nacional. Com isso, grande parte dos consumidores aderiram às listas “Do Not
Cal” .
Como está a situação no Brasil
atualmente?
Atualmente as ações de telemarketing no Brasil precisam
estar adequadas às seguintes regras:
- Do-not-call nacional (sim)
- Do-not-call estados (sim)
- Regras de renitência (autorregulamentação)
- Regras de drop (não)
- Gravação da chamada (permitida)
Podemos inferir que as regras brasileiras ficarão cada vez
mais similares às regras mais rígidas dos países ocidentais mais desenvolvidos,
portanto existe uma grande probabilidade de nos aproximarmos cada vez mais
dessas realidades e, em alguns casos, até mesmo sermos mais rigorosos.
Alguns exemplos de regulamentações que devem surgir são:
1) Regulamentação do drop.
2) Exigência de falar alguma coisa antes de dropar a
chamada.
3) Colocar a opção de opt-out dentro da própria chamada.
4) Ter um 0800 para se cadastrar em um do-not-call não
global, ou seja, para aquela empresa específica.
Recentemente, a Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel) determinou que as empresas devem implementar uma lista nacional de
consumidores que não querem receber chamadas de telemarketing destinadas a
oferecer serviços de telefonia, TV por assinatura e internet.
Essas empresas devem criar e divulgar um canal, pelo qual o
consumidor poderá manifestar seu desejo de não receber ligações.
Assim, as empresas ficam proibidas de efetuar ligações telefônicas para oferecer pacotes de serviços de telecomunicações para os consumidores dessas listas. A Anatel também estuda uma forma de combater as ligações mudas e realizadas por robôs, mesmo que objetive vender serviços de empresas não regulamentadas.
As empresas nacionais implementaram a opção de “não perturbe” como compromisso e código de conduta de autorregulamentação das práticas de telemarketing.
Cada vez mais, as empresas deverão limitar os abusos e
passar a realizar contato com pessoas realmente interessadas naquela ligação,
produto ou serviço.
Discussões sobre o tema no Brasil
Muitas são as reclamações dos consumidores e seus
representantes, como é o caso do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do
Consumidor) referente às ligações incessantes de robôs, em qualquer horário do
dia e da noite.
Para se ter uma ideia, apenas na Anatel foram registradas 11
mil queixas em 5 meses. Segundo uma pesquisa vinculada ao Ministério da Justiça
e Segurança Pública, 92,5% dos entrevistados disseram receber ligações
indesejadas de telemarketing, sendo que 56% são ofertas de serviços realizadas
por robôs.
Com base nesse cenário, muitas operadores preocupadas encaminharam propostas de autorregulamentação à Anatel se comprometendo a mudar suas regras para chamadas dois dias na semana e não mais que três vezes ao dia para o mesmo consumidor, mas isso ainda tem gerado muita discussão.
Ainda não se sabe ao certo como ficará, mas com a Lei Geral
de Proteção de Dados que irá entrar em vigor em 2020 e vem para garantir a
privacidade e segurança dos dados dos consumidores isso deve mudar.
As operadoras também estão negociando individualmente com os
órgãos reguladores. A criação dessas regras sobre vendas e serviços de
telecomunicações está sendo conversada no âmbito da revisão do Regulamento
Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações da Anatel e deve
ir à consulta pública ainda esse ano.
Atualmente, as empresas brasileiras que incomodarem os
consumidores podem ser multadas em até R$ 9 milhões. Um projeto de lei procura
aumentar isso para R$ 50 milhões.
No Brasil pode acontecer algo parecido. Se a ideia é continuar ligando para os consumidores, oferecendo soluções e serviços, será necessário cortar drasticamente as ligações desagradáveis, tendo regulamentação ou não para controlá-las.
Os consumidores não querem mais ter que atender chamadas que
não têm interesse, por isso, quando mais personalizada e seletiva for uma
chamada, melhor para a empresa e também para o consumidor.
Isso indica que as empresas devem ter uma preocupação
constante e organizar suas chamadas de modo que não atrapalhe a vida dos seus
consumidores. Não se trata do fim do telemarketing, e nem de robôs, mas de uma
nova era, em que os robôs e atendentes humanos devem ser treinados para não
invadir privacidade e ultrapassar limites.
Cobrança:
um assunto à parte
No Brasil, a discagem preditiva já chegou ao mercado de cobrança, mas as regulamentações e o Do Not Call não se aplicam às empresas de cobrança, pois existe o entendimento de que é legítimo cobrar dívidas por telefone e, muitas vezes, fica explicitado nos contratos de compra e venda que o cliente poderá ser cobrado por meio de telefone, SMS, WhatsApp e até mesmo presencialmente em casos mais extremos.
Uma nova tendência neste mercado é a cobrança 100% digital,
também conhecida como régua
digital, mas isso é assunto para outra postagem. Continue
acompanhando nosso blog para mais informações.
Como você acha que será o futuro das chamadas de telemarketing? Como sua empresa está lidando com essas regulamentações?